Com o mundo – ambientalista, empresarial e financeiro – sobre sua cabeça, Ricardo Salles decidiu promover mudanças na estrutura do Ministério do Meio Ambiente. Foram criadas a Secretaria da Amazônia, a Secretaria de Áreas Protegidas e a recriada a Secretaria de Relações Internacionais, agora rebatizada do Clima e das Relações Internacionais – esta que havia sido extinta quando Bolsonaro assumiu.
O antiministro Salles justificou a reordenação. “Percebemos que algumas áreas precisavam ser modificadas para responder algumas demandas… Essas ações com viés de ampliar o aspecto econômico. Precisa trazer dinheiro. O Brasil tem créditos florestais e aí temos mecanismos que agilizem isso.”
Essa retórica mascateira de Salles pouco faz sentido. Há um ano ele e seu chefe Bolsonaro esnobaram o Fundo Amazônia, destinado ao desenvolvimento sustentável Amazônia Legal. O capitão sugeriu a Angela Merkel que pegasse a grana e reflorestasse a Alemanha.
O passivo de Salles é tamanho que no mínimo que qualquer iniciativa suscita suspeita. Dessa vez soa como tentativa de maquiar a situação – uma maquiagem verde ou greenwashing, par inglês ver. Ou mudar para deixar tudo como está. Salles simplesmente dizimou todo o aparato de controle do desmatamento da floresta, limando a participação de organizações não-governamentais, instituições científicas e representantes de diversas entidades do processo de fiscalização.
Nessa nova composição, o Instituto Chico Mendes foi de saída colocado na berlinda, uma vez que a Secretaria de Áreas Protegidas passa a ter a prerrogativa de estabelecer a política para as unidades de conservação. A própria Associação dos Servidores do Ministério do Meio Ambiente em carta aberta ao antiministro criticando a reestruturação feita “a portas fechadas”, à revelia dos técnicos mais capacitados.
A Assemma aponta falta de clareza quanto às reais atribuições das secretarias, omissão de gestão de outros biomas e a exclusão de temas essenciais como os referentes às terras e povos indígenas e outros.
Calos Nobre, cientista do Instituto de Estudos avançados da USP, discute a possibilidade de o governo “reconhecer o erro” na condução da política ambiental, mas de a inciativa ser mais uma “propaganda”. “Mas vale dizer que o governo não tem nenhuma pessoa em cargo de chefia, seja no MMA ou no Itamaraty, que seja respeitado na área de mudanças climáticas para assumir uma secretaria que lidará com o assunto.”
Pelo que se sabe, não se cogita que haja. Já para Marcio Astrini, do Observatório do Clima, a reforma proposta no MMA equivale a um “decreto cheio de vazios.”
Vazio parece ser um alvo a ser perseguido pelo incorrigível Salles. Não faz um mês ele tentou perpetrar a substituição da meta de redução do desmatamento de 90% até 2023 nos biomas brasileiros, prevista no Plano Plurianual aprovado pelo Congresso, pelo compromisso de preservar uma área de 3,9 km² da Floresta Amazônica. Ou algo como um lote de 0,1% do total.
A tática de Salles é conhecida. Transposta para seu inverso, é fazer passar os boizinhos. Se não colar, põe-se uma placa na porteira anunciando “sob nova direção.”
E de resto “é tocar a vida e buscar uma maneira de se safar desse problema”, nas palavras do visionário capitão.